Algumas recomendações minhas (Dorgival Guedes)
Última alteração: March 21, 2013
Ao longo do tempo, a gente vai acumulando horas no processo de preparar
apresentações e textos técnicos e de assistir, ler e/ou avaliar apresentações
de outros colegas e alunos. Nesse processo, boas práticas e erros comuns se tornam
cada vez mais visíveis, muitas vezes em um processo que parece reforçar os erros.
Há muitos recursos pela rede afora com dicas sobre como preparar seminários, como
apresentar seus próprios resultados, como escrever artigos técnicos, etc.
(para alguns exemplos, confira minha página associada, de
referências úteis). Não é meu objetivo repetir
esses trabalhos, afinal, as referências estão lá;
meu objetivo é apenas preencher certas lacunas que vão sendo percebidas aqui e ali.
Dorgival
Detalhes de aplicação da língua portuguesa
Obviamente não é minha área de pesquisa, mas anos de janela ajudam...
Alguns comentários a seguir são apenas opiniões pessoais minhas, fique à
vontade para discordar e adotar outra linha -- a não ser que você seja meu
aluno! Outros são recomendações baseadas no meu entendimento do português.
Nesses casos, por favor não deixe me contactar se achar que algo está
errado, ok?
- Ponto ou vírgula? O costume de se usar linguagens de programação e
calculadoras nos faz esquecer um fato básico: em português, o sinal de separação
de casas decimais em números é a vírgula e não o ponto. O certo é ``3,3 GHz'',
não ``3.3 GHz'', por exemplo. Isso é, inclusive, norma da ABNT
(Associação Brasileira de Normas Técnicas).
Claro que isso pode ser deixado de lado ao se mostrar a saída direta de
um programa, mas não em outros casos.
- ``E'' não é precedido por vírgula. Com o costume com textos técnicos
em inglês, onde a regra é oposta, a gente passa a achar que antes de
``e'' precisamos de uma vírgula (por exemplo, ``é importante fazer isso,
e também aquilo'' Nesse caso, o ``e'' é uma
conjunção, isto é, ele liga duas ou mais ideias. Logo, não pode ser
separado dessas ideias. Não há exceções justificadas a essa regra, por mais que
você pense o contrário, e ponto final. Não, a frase anterior não é um
contra-exemplo nem um erro. Nesse caso a vírgula antes do ``e ponto final''
não separa o ``e'' da ideia original, que era ``não há exceções...'',
mas sim separa
a parte seguinte, ``por mais que você pense o contrário'', que é nesse caso uma
oração apositiva -- daí as duas vírgulas, antes e depois da mesma.
- Figura ou figura? Por outra influência da língua inglesa, onde
tende-se a colocar maiúsculas em quase tudo (como nos nomes dos meses e
dias da semana), muita gente tende a usar as mesmas regras no português (com
minúscula) também: ``como visto na Figura x...'' ou ``a Tabela
y...'' quando não devia. Em português, apenas a legenda da figura
ou tabela junto a ela mesma (o caption do LATEX, por exemplo) é
que deve começar com maiúscula (e isso o LATEXjá faz automaticamente).
O certo nos dois casos acima seria
``como visto na figura x...'' ou ``a tabela y...''. Isso está
inclusive em documentos de normas da ABNT (vide, por exemplo, item 3.10
da NBF6024, sobre numeração de seções).
Como diz um conhecido de um dos meus alunos, que é da área de jornalismo (o conhecido,
não o aluno), ``mas em que lugar das regras da língua
portuguesa está escrito que não devia ser assim?''
- Anglicismos? São as palavras originadas no inglês que
frequentemente importamos para o português. Na Computação isso é um
fenômeno bastante comum e muitas vezes inevitável. Algumas são
``aportuguesadas'', outras grafadas como no inglês.
Grande parte
já foi inclusive incluída nos bons dicionários. Apesar disso, eu
sou meio chato com essas coisas: recomendo aos meus alunos que evitem o
uso de anglicismos quando existe uma palavra em português que significa
exatamente a mesma coisa. Por exemplo:
- performance
desempenho!
- acurácia
exatidão! Para os engenheiros, inclusive, esse
último termo é definido pela ABNT, assim como precisão.
(Compare, por exemplo, as figuras:
accuracy and precision
e
precisão e
exatidão.)
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- Abreviações como e.g. e i.e? Nessa eu sei que
não estou completamente correto, pois as duas são abreviaturas de
expressões do latim: exempli gratia e id est. Mas seu uso em
textos técnicos é muito mais comum no inglês. Em português, prefiro
usar ``p.ex.'' e ``isto é'', mesmo.
- Et al ou et all? Nenhum dos dois. Essa expressão vem do latim e é,
na verdade, et alii, significando ``e outros'' (também et
aliae (feminino, ``e outras'') e et alia, que é a versão neutra).
Em geral, pode-se usar et al. -- com o ponto no fim, obrigatório!
- Referências bibliográficas. Outro tópico controverso. Em
computação, é comum usarmos identificadores numéricos ou formados pelas
iniciais dos autores. Algo como ``o trabalho de Fulano
[13]...'',
ou ``como verificado na literatura [XYZ05]...''. Na minha
opinião, esses colchetes não fazem parte do discurso, são apenas algo como
um aposto ou uma observação entre parênteses. Sendo assim, eu recomendo aos
meus alunos evitar coisas como ``como visto em [13]...'',
ou ``[XYZ05] afirma que...'' e preferir a forma dos dois
trechos exemplo anteriores. Basicamente, o texto deve ser escrito de forma
que, se você retirar as referências entre colchetes, o que restar continua a fazer sentido.
No
modelo padrão para teses e dissertações em LATEXdo
DCC/UFMG,
inclusive, já se define dois tipos de citação: \cite para quando se
pretende usar a referência como parte do texto e \citep para quando a citação
deve aparecer apenas entre parênteses (colchetes).
Uso do LATEX
A melhor ferramenta para o desenvolvimento de textos técnicos (ainda) é o LATEX.
(Se você ainda não conhece e pretende trabalhar comigo, pode começar a conhecer.)
- Linhas no editor de textos:
Configure o seu editor de textos para quebrar linhas a cada 80
caracteres, mais ou menos. Não escreva um parágrafo inteiro como uma
única linha.
Editores como o Word (que interpreta a quebra de linha --
Enter ou Return -- como fim de parágrafo)
e telas grandes fazem com que alguns prefiram
escrever parágrafos longos como uma única linha. Isso tem dois
problemas: torna o trabalho de quem usa editores como o vi (p.ex., eu) um pesadelo e dificulta o uso de ferramentas de
comparação de texto como o diff.
- Divisão de sílabas:
Nem sempre se encontra uma instalação do sistema feita com todos os cuidados,
especialmente no que diz respeito a problemas específicos do português. Por isso,
confira sempre a quebra de palavras feitas pelo sistema ao fim de cada linha.
Volta-e-meia o sistema se confunde e faz alguma separação de sílabas completamente
errada (por exemplo, em uma dissertação de mestrado recente: ``ass-imilar'')!
- Não divisão de sílabas:
O sistema tem alguns problemas para lidar com
palavras acentuadas, que muitas vezes invadem a margem direita porque não
foi possível ao programa decidir onde quebrá-las. Se isso acontecer, lembre-se do
comando de sugestão de divisão de sílabas, o ``
-''.
- Referências bibliográficas:
Em particular, o BibTeX, responsável pela montagem das referências,
dependendo do seu ambiente, pode não fazer um bom
trabalho na formatação das referências em português. Isso às vezes se deve
ao arquivo .bib usado (como nomes de meses em inglês), que podem ser
corrigidos naquele arquivo, mas às vezes são coisas geradas pelo programa,
o que pode exigir edição da saída (por exemplo, em alguns formatos ele
podem escrever pages ou usar a abreviatura pp.
A solução mais correta e definitiva seria corrigir os arquivos de
configuração dos estilos do LATEX, mas isso costuma exigir um domínio
maior do sistema.
Uma outra solução é editar o arquivo .bbl gerado pelo BibTeX,
que é o que o LATEXrealmente usa na produção do documento. Coisas a corrigir
são, por exemplo, o uso de and para a lista de autores, pp. como
abreviatura de ``páginas'', nomes de meses em inglês, dissertation, etc.
Essa edição deve ser feita depois de executar o BibTex, mas antes de executar o
LATEX.
- Espaços e espaços inquebráveis (o til):
Em LATEX, o til é usado para representar um ``espaço inquebrável'',
que separa duas palavras mas onde a linha não pode ser quebrada. É
recomendável usá-lo antes de referências bibliográficas, para separar
números de unidades, etc. (p.ex.,
citando fulano~\cite{reffulano} ou 13,5~ms). Para
garantir que não haja quebra de linha, não pode haver outro espaço além
do til, quer dizer, 13,5 ~ms não funciona. Também não pode
deixar para escrever o til no começo da linha de baixo (quebra de linha
também é espaço).
Preparação de apresentações
Muito já foi dito, então vamos ao mais importante:
- Ensaie, ensaie, ensaie...
E ensaie de novo. Se você ainda não tem larga experiência com apresentações, a
prática é essencial. Só assim você sabe o tempo que vai gastar de verdade, por
exemplo, e vai lembrar de coisas que tinha se esquecido de mencionar.
- Um slide = +/- 1 a 3 minutos (dependendo do conteúdo)!
Não, não adianta querer apresentar todos aqueles 40 slides com resultados super legais na sua
apresentacao de 15 minutos: não vai dar. O tempo exato depende do estilo de cada
apresentador, mas de um a três minutos por slide normalmente é uma boa aproximação
(antigamente, com transparências no retroprojetor, usava-se três minutos, pois
elas eram caras e a gente colocava muita coisa em cada uma; agora, com
apresentações no computador, tendemos a usar mais slides, com menos
conteúdo em cada um).
- Foque no essencial! Já que não vai dar para apresentar tanta
transparência no tempo que você tem (mesmo!),
concentre-se no essencial. Tente responder a
pergunta: qual a ideia mais importante que você gostaria que os seus ouvintes
levassem da apresentação?
- Texto: nem de mais, nem de menos... Quanto texto usar nas
transparências? Há controvérsias, mas para quem ainda não tem muita
experiência, uma boa regra é: apenas o essencial, mas não menos.
O seu público não está lá para
passar o tempo todo lendo texto das transparências, muito menos elas devem
servir para você lê-las. Por outro lado,
elas não devem servir apenas como uma ``lista de lavanderia'',
apenas com palavras chave para você se lembrar do que vai falar, que não
servirá de nada para os ouvintes.
- Uma imagem, mil palavras... Normalmente, imagens ajudam muito na
apresentação: a imagem dá o arcabouço, você preenche os detalhes. E mil palavras
tomam um bom tempo da apresentação, então conte esse tempo se for usar uma
figura que você pretende comentar em detalhes!
Footnotes
- ...ExatidaoPrecisao.jpg.)
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- Imagens obtidas dos links:
http://www.wellesley.edu/Chemistry/Chem105manual/Appendices/uncertainty_analysis.html
e
http://www.ufpa.br/quimicanalitica/precisaoexatidao.htm.
Dorgival Guedes
2013-03-21